sexta-feira, 30 de setembro de 2011

ZÉ LIPPI


ripado de http://cinezezelippi.wordpress.com/zeze-lippi/

Coelho De Moraes

O cinema tem disso. Guarda e esconde. Trabalha com o passado que fiz. Fixa o presente para jogar na memória. Presente fixo. Deixa rolar a fita que ele se dramatiza, movimenta o passado e no hoje reciclamos aquilo que já foi. Antropofagia.
Zé Lippi trabalhou em cinema durante muito tempo e isso será amplamente repetido pelos jornais.  Ele é o projecionista do Cinema Paradiso aqui em Mococa. Amigo do meu pai, - que era alfaiate e também Zé era, - Lippi deixa o mundo durante a mudança radical por que passa a indústria cinematográfica. Quando mudou a alfaiataria meu pai também parou, só não deixou o mundo, a não ser que sua mudança de residência para Mococa tenha sido alguma metáfora.
Esses Zés amigos e  arceburguenses fazem dessas coisas mas não perdem o sorriso.
Zé Lippi foi mas está fixado na historia do cinema local. Não do fazer filmes mas o de projetá-los e preservar a morredoura (sim, a decadente)  atitude de ir ao cinema, sentar e comer pipoca. Isso está acabando. Hoje o motivo de ir ao cinema é qualquer outro que não ver o filme.  O projeto de ‘ir ao cinema’ está em FadeOut.
Não o filme, a indústria de produção,  mas o ato de ir ao cinema deixa de ser lazer e logo logo sumirá do mapa. O cinema parece se ampliar em distribuição mundial com as facilidades da tecnologia e dos tablets. Mas desaparece nas salas vazias.
O mundo é assim.
Inventamos uma TV domiciliar gigantesca para competir com o cinema, mas, vemos imagens 3X4 nos celulares. Imaginem Lawrence da Arábia no celular! Ou o Piratas 4! Avatar nem digo pois o celular vive de Avatares.
Os Zés aqueles achavam que não. Que o mundo era fixo também como se o sol girasse em volta deles. ‘Epuur se muove’ disse um cego Galileu e este disse e via  mais do que nós, povos da civilização da óptica e do poder de ver, de conseguir enxergar. Galileu não era Zé e acredito que os Zés têm essa intrincada essência de achar que o mundo é do jeito que vêm e que nunca muda. Ainda mais se esses Zés forem oriundo das Gerais.
A vida, o mundo, podia ser uma fita de cinema. As estrelas por mais glamurosa que fossem certamente eram virgens angelicais e aquele imundo bandido claramente mostrado no começo do filme seria punido no fim.  Quando quiser a alegria de volta eu boto o Zé Trindade para debochar de todo mundo, inclusive de si mesmo. Se desejar melancolias roceiras e atitude ranzinza eu chamo o Mazzaropi e curto a maleducação caipira que carregava contra os coronéis. Mas tudo é filme. Não passa de fita.
- Zézé, você está fazendo fita, menino, - dizia a mãe do Lippi. E o Zezé queria era fazer a fita rolar buscando os buraquinhos das cremalheiras e os tortuosas caminhos em direção à lente. Daí num salto a nova realidade se grudaria na parede por duas horas.
Zé Lippi manteve o cinema de Mococa funcionando, saiu, voltou, enquanto ia buscar o neto na escola Nancy, projetou mil fitas, carregou centenas de máquinas, torceu pelo Palmeiras, - que é o correto dos oriundi, - pintou os dedos de carvão, estropiou os olhos contra a grande luz do bojo grávido da projeção, andava sorrindo pelas ruas, cumprimentava as gentes da catraca, ‘miles’ de amigos, patronisa cineclube, ganha diplomas, ganha homenagens, fez seu trabalho e foi dormir no plano das idéias dos outros que o amaram.
Quando um pólo de cinema surgir em Mococa que se faça um filme sobre o Zé Lippi.
Será um filme do bem, da alegria de viver, do amor ao trabalho, da manutenção da arte sétima e maior; isso nos sugere que o Zé Lippi dormita agora no sétimo céu medieval.
Com ou sem Galileu para perturbar a desordem do Universo.

domingo, 25 de setembro de 2011

O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA


foto ripada de catracalivre.folha.uol.com.br

Coelho De Moraes

            Produtores e Realizadores internacionais resolveram, por bem, oferecer aos cinéfilos de todo mundo uma obra baseada no livro de Gabriel Garcia Marques.
            O filme é bonito e bem adaptado, em que pese adaptar um romance, inda mais em se tratando de um Nobel de Literatura. Na imagem fílmica a história pode até ficar outra. No entanto, no caso desse específico “CÓLERA” pesou mais o colonialismo.  Os produtores escolheram atrizes e atores que ganharam ou foram indicados ao Oscar, sendo todos artistas latinos ou de língua latina. Todos excelentes. Fernanda Montenegro (Brasil), Javier Bardem (Espanha), Giovanna Mezzogiorno (Itália), mexicanos, colombianos,  tendo ainda a voz de Shakira para completar a sonoridade latino-americana, com um cancioneiro lamentoso da América do Sul e Central. A paisagem caribenha dava sua cor lapidada em tons de sol e céu anilado.   Porém, todos os artistas falavam no idioma inglês, que mata o texto e, no caso,  mata a interpretação. Para o ouvido limitado do americano do norte, atrizes e atores, falando em inglês, carregam no sotaque e, isso já será considerado outra língua lá para eles.
            Um bom exemplo é a modernosa adaptação d’O CRIME DO PADRE AMARO, em espanhol-mexicano. Porém, no “CÓLERA”, a metrópole manda. A colônia obedece. Fala mais alto a voz do mercado. Fala mais baixo a língua castelhana, que, apesar disso,  vem ganhando seu espaço no planeta.
            O treinamento mais intenso que precisamos ter é o de pensar originalmente, mas, frequentadores assíduos de novelas não terão essa oportunidade.
            Ler outros autores que não o mago Coelho também será obrigatório e, para quem gosta de andarilhagem e coisas de Santiago de Compostela existe um livro escrito aqui em Mococa, autor local,  que conta, com realidade, como se faz aquele caminho. Autor: Itelberto Peres. É pegar e ler e se manifestar, pois, permanecer refestelado e contemplativo não faz a cidade andar.
            Mas, a peste colérica ganhou a parada e a plêiade de artistas passou a falar em falso inglês. Os latinos freqüentadores de cinema terão que se ater a legendas nos filmes importados da Metrópole, como sempre.
            Dessa forma fica uma sugestão para o artista mocoquense: bolar roteiros e enredos de peças teatrais sem texto algum.  Assim todos entenderão, independente do país e do idioma, até mesmo no Japão. Será um produto de exportação facilitada.
            A educação no país  já é precária.  As obras na tela grande consomem o que nos resta da linguagem com péssima legendagem, e piora se não assistirmos os nossos produtos cinematográficos brasileiros. Valorizar a obra brasileira, então, é obrigação de todos e independe de gostar ou não. É necessário aprender que existem múltiplos olhares para se enxergar a realidade. Aprender que o modo americano de fazer filmes é apenas um deles e não é, necessariamente, o melhor. Existe o italiano, o hindu, o francês, o alemão... cada um em sua linha, cada um com sua graça e peculiaridade.
            Para acompanhar o processo de adaptação leia o livro “O AMOR NOS TEMPOS DO CÓLERA”. Estude as imagens que o diretor do filme criou e compare com a sua imagem de leitor. É, também esse, um exercício vigoroso para ganhar poder crítico. Para ganhar distanciamento. Para ampliar o poder de observação.
            Dá próxima vez em que for à locadora pegue somente filme brasileiro. Ou experimente os latino-americanos. Haverá muita surpresa. Exemplo: muito filme que já passou em nosso circuito – CARANDIRU ou PIXOTE – é produto brasileiro e foi dirigido por um artista argentino.

TREM DA CULTURA E ACESSÓRIOS


foto retirada de culturamix.com
Coelho De Moraes 

Dentro da conferência geral que empreendemos durante essas semanas, abusando da paciência do leitor, a título de apresentações e trabalhos executados no âmbito da cultura, apresentamos mais um sucedâneos de ações. Aquilo que é ou que foi –  sempre surpreendente – o TREM DA CULTURA, jornal devezenquandário, nascido em Arceburgo nos idos de 97 e que depois ganhou ares mocoquenses.
A idéia era formatar um periódico que falasse sobre filosofia e literatura em geral, palpitasse e criticasse à vontade, em textos curtos, sem esquecer da crítica e da agenda cultural. Foi em 1997, junto aos jovens do GRADA - Grupo de Artes Dramáticas de Arceburgo, que tudo nasceu. O GRADA entrou na caverna em 1999.
Os grupos não param. Hibernam, mas não param. Mesmo por que são muitos os trabalhos e nós somos poucos empreendedores. Se a atividade se limitasse a teatro apenas, talvez ficasse mais fácil.
O TREM DA CULTURA teve poucos números, se dando ao, luxo de até de pular o número 5.  Não conseguindo ser periódico, pois teve vida curta em sua terra natal graças à burrice crônica da política local da época – estamos efetuando pesquisas sobre a atual - , uma vez que estava em 97 atrelado à Escola Municipal de Artes Dramática e Musicais de Arceburgo. Fechadas tais portas O TREM se mudou para Mococa e se desenvolveu com a criatividade de Scarparo Maciel.
Graças ao estudo dos métodos e da geração de diagramas que o TREM tomou sua forma final, doze ou treze números depois. Temos dúvida pois, como já disse, o número cinco nunca saiu. Esquecemo-nos dele.
Compilações, História da Arte, pequenos contos, um Concurso Nacional de Poesia, críticas, textos crípticos (quer dizer, textos cujos assuntos estão sob código ou escritos de maneira bem arquitetada, própria para a compreensão de poucos), piadas enfadonhas, pensamentos em geral, resumos, foram matéria constante do TREM DA CULTURA. Hoje a abordagem será diferente.  Há  computadores por todo lado e os gatilhos da Internet nos levam a bolar um TREM DA CULTURA online, ou, pelo menos, enviado para cada e-mail, na forma de um bom SPAM, pois foi para o SPAM que a internet foi feita, por que se for para ser lerdo eu mando carta.
Os internautas, sábios jovens da informática e da rede – mesmo que só para uso de chats chatos e pesquisas escolares – estão com a faca, o queijo e a goiabada na mão.
Além do TREM,surgiram o NUNCA LEIA!, o PRODUÇÃO DE ARTE e mais recentemente o KULTURA?; todos, com intuito de promover o trabalho cultural.

E hoje? Vamos conferir e fazer a chamada.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

FILOSOFIA / CULTURA / LIBERDADE


 baruch espinosa
 
Coelho De Moraes, após leitura de Marilena Chauí.

Havia uma pedra no meio do caminho, disse o poeta, sabendo bem que  havia um mundo após a pedra. Não fere as retinas cansadas, como acontecera ao poeta, mas leva-nos a percorrer outras sendas, percalços obrigatórios para quem está vivo e atira pedras para todos lado.
Morto não tira pedra. Cliente morto não paga, segundo Steve Martim.
A pedra fora a de maio de 1968 e tudo o que o ano de 1968 significou mundo afora, de Paris a Praga, de São Paulo a Berkeley, de Mococa e Milagres,  do Paralelo 27 ao Araguaia.
Em outubro de 1968, como um dos efeitos de maio, abriram-se as portas da universidade nova, a universidade crítica na qual se reuniam e debatiam as esquerdas do mundo inteiro, dos anarquistas aos comunistas, dos socialistas aos trotskistas, dos social-democratas aos maoístas, enfim, esquerda como que dizendo: - aqueles que lutam e reamm contra o sistema de produção que transforma chaplins em autômatos.  
Nascia a Universidade de Vincennes. No dia Primeiro de Outubro: a aula inaugural proferida por Herbert Marcuse. No início da tarde, Michel Foucault iniciou um curso que antecipava o que viria a ser a Microfísica do poder. No final da tarde, Deleuze dava início ao seu curso sobre Espinosa.
A Filosofia prevalecia como vocação para a liberdade:
citemos Chauí
“ E nós, com a felicidade, Que em nosso pensamento é uma ascensão, Teríamos uma emoção, vizinha do espanto, que nos agarra Quando uma coisa feliz despencasobre nós”.

Sei que nos dias que correm a filosofia é considerada mais uma profissão entre outras.
Por que se dedicar à Filosofia?
Havia um livro: Era Quo Vadis. Li, reli, tresli, sabia de cor algumas passagens e particularmente
o início, que me intrigara.  Petrônio estivera num festim no palácio de Nero e ali discutira com Lucano e Sêneca sobre a existência ou não da alma nas mulheres. E toda vez eu me perguntava como era possível alguém fazer essa pergunta, pois era evidente que as mulheres possuem alma. Na época, eu não sabia que devia essa certeza ao cristianismo, mas também não sabia que a simples admissão de alma nas mulheres não lhes havia adiantado muito pois o Paulão ainda dizia que homem anda na frente e mulher obedece, com alma e tudo.
Aparecia, com clareza, que a luta pela justiça, pela igualdade, pela liberdade não era uma luta moral, nascida do espírito da caridade, mas, ação política consciente determinada pela própria história. E tome atitude nisso, homens e mulhres. Era possível uma sociedade nova (sim), justa ( não sei direito o que é isso, quem regula a justiça?) e igualitária não simplesmente por causa de nossa indignação diante da injustiça e da desigualdade, mas porque era possível compreender suas causas e destruí-las.
É deslumbrante o fato de que o pensamento é capaz de pensar sobre si mesmo (reflete-se), que a linguagem pode falar de si mesma, que perceber e conhecer poderiam não ser o mesmo. O mundo se tornava, ao mesmo tempo, estranho, paradoxal e espantoso, aberto, amplo, e de fácil desorganização. Bastava dizer não e esquecer a cara de coitadinho própria dos heróis que dizem não...
Outras vezes, porém, penso que fui para a filosofia quando não mais podia tolerar a cultura da culpa cristã em que fomos criados. Sentia que era preciso encontrar outra ética em que a liberdade e a felicidade pudessem identificar-se – essa procura sempre endereça a Espinosa.
Talvez por causa dessas lembranças não posso considerar a filosofia uma profissão entre outras. Quem busca a filosofia como forma de expressão de seu pensamento, de seus sentimentos, de seus desejos e de suas ações, decidiu-se por um modo de vida, um certo modo de interrogação e uma certa relação com a verdade, a liberdade, a justiça e a felicidade. Mesmo em sala de aula, na atitude  professor, profissional contratado para falar sobre Filosofia, este professor deverá desencadear o estranho. Previsivelmente aquilo que lhe trará problemas com a  família do aluno e, muita vez, com a escola. Não a verdade da burocracia, nem a honestidade da ‘res’ publica pois tudo isso é invencionice para enganar tolos. É uma decisão existencial, como nos aparece com tanta clareza nas primeiras linhas do Tratado da emenda do intelecto, de Espinosa. Essa decisão, penso também, não é possível se não admitirmos com Espinosa que pensar é a virtude própria da alma.
Sua excelência.

imagem retirada do sitio marcelloggjuventude.blogspot.com

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